Os mercados globais acumulam perdas de quase US$ 10 trilhões desde o Libertation Day, quando o governo do presidente dos EUA, Donald Trump, impôs uma série de tarifas de importação a todos os países do mundo, desencadeando uma guerra comercial.
O baque mundial dos mercados acionários é puxado, sobretudo, pela empresas americanas. O índice VIX — conhecido como “índice do medo” — disparou, refletindo a aversão ao risco em meio a um cenário de incertezas crescentes, tanto na política monetária quanto no comércio global.
Em entrevista ao programa Stock Pickers, apresentado por Lucas Collazo e Henrique Esteter, o economista Gustavo Medeiros, head global de macro research da gestora Ashmore — uma das mais relevantes do mundo em mercados emergentes —, avalia que esse movimento pode ser o prenúncio do fim do chamado “excepcionalismo americano”.

“Estamos vendo um momento de capitulation no mercado, com vendas forçadas, alta rotatividade de portfólios e investidores desistindo das posições.”
Para ele, o aumento do volume negociado é sintomático de uma possível mudança estrutural no funcionamento do mercado.
“Sim, eu acho que estamos vendo o começo do fim do excepcionalismo americano.”
Excepcionalismo se sustentava em políticas fiscais pró-cíclicas
Segundo o economista, esse excepcionalismo se sustentava em políticas fiscais pró-cíclicas que, atualmente, perderam força. E agora, com a nova escalada tarifária promovida pelo ex-presidente Donald Trump, essa transição tende a ser ainda mais dramática.
“O mercado ainda aposta muito na visão de que Trump usa a política tarifária como uma ferramenta de negociação. Ele quer todos na mesa para impor seus termos. Se você se opõe, ele se torna seu inimigo; se aceita, ele vira seu melhor amigo”, resumiu.
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Medeiros destacou que o mercado reagiu de forma sensível a uma notícia falsa sobre a suspensão da agenda tarifária por 90 dias — o que bastou para fazer as bolsas dispararem. Mas ao longo da semana, à medida que rumores apontavam foco em novas disputas com Japão e Coreia, o humor voltou a azedar.
O economista também chamou atenção para dados históricos preocupantes. “A tarifa média dos EUA era de 3,7%. No terceiro mês do governo Trump, saltou para 22%. Isso nos leva de volta aos anos 1930”, disse. Para ele, não é razoável imaginar um retorno integral a níveis pré-Trump, o que indica uma transformação estrutural no comércio global.
Apesar de considerar Peter Navarro — ex-conselheiro econômico de Trump — como um dos mais radicais defensores do protecionismo, Medeiros acredita que Trump, por instinto político, compreende os riscos de adotar tarifas tão altas.
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“Trump sabe que, ao elevar tarifas, provoca estagflação: crescimento baixo com inflação alta, queda no poder de compra, alta do desemprego e desaquecimento do consumo.”

Existem precedentes que servem de alerta
Segundo ele, há precedentes históricos que devem servir de alerta. No fim do século 19, o então político republicano William McKinley defendeu uma alta expressiva nas tarifas, o que levou seu partido a sofrer a terceira maior derrota já registrada no Congresso americano, perdendo 100 assentos em um único ano.
A lógica do “tarifaço” como instrumento político não é nova para Trump. “Ele é um incorporador imobiliário. Enxerga o mundo como um jogo de soma zero, em que precisa extrair valor máximo de cada negociação”, analisou Medeiros.
Por fim, ele ressaltou que, apesar da retórica agressiva, Trump pode moderar seu discurso se a economia americana começar a mostrar sinais mais claros de fragilidade.
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“Há pressão política para reduzir tarifas. Até Elon Musk já repostou vídeos defendendo o livre comércio, o que mostra que há resistência mesmo dentro da base conservadora.”
O cenário, portanto, aponta para um mercado em transição — tanto nos fundamentos quanto na política. A incerteza permanece, mas uma coisa é certa: o excepcionalismo americano está sendo colocado à prova.
Fonte: Infomoney